RIO - Em 13 de maio de 1888, após assinar a Lei Áurea, a princesa Isabel correu para a sacada do Paço Imperial e anunciou ao povo a abolição da escravatura. Talvez uma das sacadas mais importantes do Brasil, o lugar histórico só podia ser admirado da Praça XV, do lado de fora do prédio. Entrar e conhecer, não podia. Até agora.



Depois de ficar fechado por oito meses e passar por uma importante reforma estrutural no valor de R$ 2,9 milhões, o Paço reabre suas portas evidenciando ainda mais seu projeto arquitetônico e permitindo que o público tenha acesso a áreas antes fechadas.
Para celebrar a reabertura, o espaço inaugura a grande exposição “1911-2011 — Arte brasileira e depois, na coleção Itaú”, um recorte da produção artística realizada no país nos últimos cem anos, com obras de nomes que vão de Lasar Segall e Candido Portinari até Nuno Ramos e Cabelo.
Sem passar por restaurações desde o início dos anos 1980 — entre 1982 e 1985, foi feita a obra que permitiu que a construção fosse o primeiro prédio tombado do Brasil transformado em espaço expositivo de arte contemporânea —, o Paço Imperial foi fechado em março para uma reforma cujo objetivo é evitar que o edifício tenha de passar por uma maior e mais complicada obra no futuro.
— Com esse restauro, acredito que o prédio não vá precisar de reformas pelos próximos 50 anos — prevê Lauro Cavalcanti, diretor do Paço. — Mas é claro que são necessários cuidados. Um edifício como esse tem uma manutenção igual à de um avião.
Os seis mil metros quadrados do prédio, construídos paulatinamente desde o século XVIII, foram reformados com a preocupação, segundo Lauro, de evidenciar os aspectos arquitetônicos da construção.
Agora, as salas passam a ter sinalização que conta suas histórias e ficam visíveis, pelo lado interno do prédio, a janela da qual D. Pedro I comunicou sua permanência no Brasil — o Dia do Fico — e a sacada da Lei Áurea. A Sala dos Archeiros ganhou novo tratamento acústico e sistema de ar condicionado silencioso.
Antes sem poder receber grandes esculturas e vitrines devido ao desnível do chão, a sala do Dossel teve as fundações de seu piso restauradas. Além disso, todas as esquadrias de madeira foram revistas, a parte elétrica, refeita, e o telhado, recuperado. O teto e os dutos de refrigeração ganharam um tom mais claro de cinza e o piso de madeira foi clareado.
Tudo em nova ordem para receber a enorme mostra do Itaú. A cargo de Teixeira Coelho, curador-diretor do Museu de Arte de São Paulo (Masp), a exposição reúne 186 obras selecionadas entre as mais de 3,6 mil pertencentes à coleção da família Setubal. São 137 artistas brasileiros, de José Pancetti a Rodolpho Parigi (que possui a obra mais recente, “Vermelho Grace Jones”, de 2011) passando por Iberê Camargo, Maria Martins e Beatriz Milhazes, entre outros.
Para que o visitante assimile melhor cada trabalho, Coelho dividiu as obras em uma série de grupos e subgrupos. Em “A marca humana”, primeiro módulo da exposição, o curador reuniu apenas os trabalhos em que a figura do homem ainda é central. São obras do início do modernismo, como “Seringueiros”, de Cândido Portinari, e “A pequena aldeã”, de Lasar Segall — feita em 1911, é a mais antiga da mostra.
O espectador segue então observando mais cinco módulos principais: “Irrealismos”, que foca uma realidade mais fantástica; “Modos de abstração”, em que estão presentes trabalhos abstratos, concretos e neoconcretos, de Volpi a Oiticica; “A contestação pop”, que reúne artistas de forte caráter questionador, como Rubens Gerchman e Paulo Bruscky; “Na linha da ideia”, com 56 obras de artistas que ignoram a funcionalidade e a finalidade dos trabalhos; e “Outros modos, outras mídias”, conjunto que apresenta obras em diversos suportes, como a videoinstalação “Marca registrada”, de Leticia Parente.
— Não é uma exposição cansativa — afirma Coelho. — Não gosto de fazer mostras para crítico ou artista. Meu objetivo é fazer exposições para o grande público, e acho que essa é muito interessante, porque aborda a história da arte brasileira sem ser monótona. Tem obra para todos os gostos.
Agora com a infraestrutura necessária para receber grandes exposições, o Paço já marcou as próximas, entre elas uma dedicada aos trabalhos gráficos do pintor britânico Lucian Freud (1922-2011), em novembro de 2012, e uma retrospectiva de Beatriz Milhazes, em 2013.
Nenhum comentário:
Postar um comentário